sexta-feira, 25 de janeiro de 2008

Unidose: Bom Remédio


Num contexto em que a discussão política vem perdendo substância e se centra, cada vez mais, na injúria verbal entre os seus protagonistas afinal ainda há espaço para as ideias.

Esta semana, numa conferência de imprensa na Assembleia da República, o CDS-PP apresentou uma proposta concreta que merece, pelo menos, ser tida em conta: a venda de medicamentos em unidose.

Num país hipocondríaco, o Serviço Nacional de Saúde prevê gastar, segundo o orçamento de Estado para este ano, 1500 milhões de euros na compra de medicamentos.

Segundo palavras da deputada Teresa Caeiro «10% dos medicamentos vendidos não são consumidos».

Penso que este número pecará (largamente) por defeito pois só deverá ter em conta os medicamentos entregues nas farmácias, dado que aqueles que são deitados ao lixo dificilmente poderão ser contabilizados.

Como sabemos, até da nossa experiência pessoal, raramente damos uso a todas as cápsulas dos medicamentos que nos são prescritos. Mas nem por isso deixamos de pagar a totalidade do fármaco.

Numa altura de racionalização de custos com a Saúde que lógica terá para o Estado português manter um negócio que só beneficia uma de três partes?

Nem ao Estado interessa ficar ainda maior devedor em relação à indústria farmacêutica, nem aos doentes interessa pagar a totalidade de algo de que só fazem uso de parte.

Deixar as coisas no estado em que estão apenas beneficia o lobby farmacêutico.

Em reacção à medida proposta pelo CDS o presidente da Associação Portuguesa de Indústria farmacêutica disse o seguinte: «Mexer na embalagem original do medicamento que foi testada, validada e produzida em ambiente estéril, muitas vezes com uma série de condicionantes, para fazer uma dispensa individualizada leva-nos a abrir uma porta que possa eventualmente ocasionar mais erros e a permitir algum tipo de falsificação».

Alguém acha crível que haja complicações técnicas para embalar um comprimido ao invés de dez?

Felizmente na análise do discurso existe uma coisa chamada pragmática que permite interpretar os conteúdos metalinguisticos. Em traço simples isto significa perceber as intenções para lá daquilo que é dito.

Quando se confronta o presidente de uma associação com uma medida que beneficia os compradores e ele se limita a falar de medidas de segurança e a demonstrar preocupações com uma eventual contrafacção dos fármacos isto denota que, para a indústria farmacêutica, os medicamentos são encarados como um bem comercial e não como um bem público. Primeiro o lucro, depois os doentes.

Só assim compreendemos que não foi por acaso que os genéricos tiveram tantas dificuldades de implementação.

A proposta do CDS aponta para uma poupança de 140 milhões de euros por parte do Estado e compradores caso o esquema da venda de medicamentos unidose entre em vigor. Sem dúvida uma medida de grande utilidade para o país.

Mas caso alguma vez entre em vigor serão precisas muitas unidoses de Rennie para curar a indigestão a muita boa gente.

sábado, 19 de janeiro de 2008

Meyong: Duas sem Três


Mais um escândalo no futebol português, uma vez mais com o nome do Belenenses envolvido.

2006/2007. O «Caso Mateus», nome pelo qual ficou conhecido o episódio, foi despoletado devido a acusações do Belenenses devido a supostas irregularidades no contrato do jogador Mateus contratualmente vinculado ao Gil Vicente.

Durante meses a fio estes dois clubes, pela pessoa dos seus respectivos presidentes, Cabral Ferreira (Belenenses) e António Fiúza (Gil Vicente) entupiram tribunais desportivos e cíveis alegando estar em causa a verdade desportiva.

No epicentro da discussão estava a irregularidade contratual do internacional Angolano Mateus, um jogador que teria assinado um contrato profissional sem a permanência (obrigatória) de um ano enquanto jogador amador.

A luta selvática que se desenrolou diariamente nos órgãos de comunicação chegou mesmo a tornar-se uma nova cruzada norte-sul, nas palavras de Manuel Carvalho do Público o «testemunho veemente da velhacaria em que mergulhou o futebol português. (..) onde vegeta tanta gente sem escrúpulos»

Assim sendo, em 2006/2007, o clube de Belém asseguraria a manutenção na Primeira Liga não no campo mas na secretaria tranquilizando os sócios. Afinal mesmo que a equipa de futebol não desse conta do recado, pelo menos tinham um departamento juridico capaz de ombrear com os grande e garantir vitórias “desportivas”.

Mas no melhor pano cai a nódoa. Seria igualmente por um motivo jurídico que toda a estrutura directiva do Belenenses ruiria devido, curiosamente, a um problema contratual de um atleta: Meyong

Dizem as directrizes da FIFA que um jogador se pode inscrever por três emblemas distintos numa só época embora apenas possa jogar por dois.

Meyong, jogador do Levante, jogou alguns minutos na pré-época sendo posteriormente emprestado ao Albacete o que impossibilitava, desde logo, a possibilidade do atleta jogar pelo Belenenses. Por desconhecimento das leis ou por má fé o Levante não terá comunicado o facto ao clube da Cruz de Cristo.

O certo é que o caso Meyong já fez rolar cabeças. O primeiro, o director desportivo do Belenenses, Carlos Janela e o próprio presidente do clube, Cabral Ferreira que alegou demitir-se por «motivos de saúde».

Lá dizem os nossos amigos do outro lado do Atlântico..Pimenta em determinado sítio do vizinho é refresco..

quinta-feira, 10 de janeiro de 2008

Liga: Tragédia Grega


O país parou por causa de um empurrão e de um dedo em riste.

Katsouranis e Luisão, ambos jogadores do Benfica, foram os protagonistas do episódio bizarro da semana.

Mas este artigo não visa analisar o incidente em si nem tomar partido nem do Grego nem do Brasileiro, nem sequer aferir quem, dentro da estrutura do clube, terá que acartar com as responsabilidades. Aquilo que pretendo evidenciar é a falta de ética desportiva da Liga de Clubes, entidade que gere os casos de indisciplina no Futebol Português.

Que se saiba Portugal é um Estado de Direito e que, curiosamente, segundo o artigo 13 da Constituição da Portuguesa, denominado de Principio de Igualdade, está contemplado o principio de que «Todos os cidadãos têm a mesma dignidade social e são iguais perante a lei».

Agora pergunto, porque é que a Comissão Disciplinar da Liga (CD) é recorrente no desrespeito por este principio?

Estará o futebol acima do direito e das leis?

Após o incidente que envolveu Katsouranis o jogador foi alvo de processo disciplinar imposto pelo Benfica a que se veio juntar um processo sumaríssimo instaurado pela Liga.

Para que se perceba o processo sumaríssimo apenas é instaurado caso um acto atentatório para a ética desportiva passe despercebido à equipa de arbitragem. Neste caso a Comissão Disciplinar da Liga baseia-se nas imagens televisivas para decidir os castigos a aplicar.

A comissão disciplina considerou a conduta de Katsouranis "grave" e punível com o artigo 126º do regulamento disciplinar que contempla que "os jogadores que usem expressões (..) ou gestos de carácter injurioso, difamatório ou grosseiro devem ser punidos.». O relatório da CD acrescenta que, para a tomada de decisão recorreu «às fotografias e imagens do jogo»

É aqui que a porca torce o rabo.

Katsouranis foi suspenso por causa de uma foto do jornal "A Bola", não pelas imagens televisivas.

Em Portugal, à excepção dos jogos que envolvem os três grandes poucos são os que têm transmissão televisiva e uma grande cobertura mediática.

Aquilo que está em causa não é a legitimidade do castigo de Katsouranis, é o principio de igualdade entre todos os atletas dado que nem todos os encontros da liga estão munidos de meios técnicos que permitam detectar comportamentos semelhantes.

Ou se abandona esta prática ou se dotam todos os Estádios dos mesmo meios de forma a garantir um tratamento equitativo dos atletas.