quarta-feira, 30 de julho de 2008

Tudo bons Rapazes


Tivesse Noé a braços com uma tormenta em alto mar e se, na sua Arca, em vez animais tivesse classes profissionais a primeira a ir borda fora seria a dos jogadores de Futebol.

Tradicionalmente nos comentários mais sexistas diz-se que os serões familiares passados em frente ao televisor são divididos entre o Futebol para eles e a Novela para elas.

A verdade é que apesar de aparentemente incompatíveis estes formatos, Novelas e Futebol, são feitos do mesmo molde. Afinal de contas ano após ano mudam as caras, mas o enredo é sempre o mesmo.


Tal como no enredo novelesco os futebolistas são arquétipos lineares, ou seja, são aquelas personagens básicas, aquelas que mal surgem no primeiro episódio sabemos que vão acabar sozinhos ou vão ter um acidente fatal. No Futebol tal como nas novelas os jogadores encaixam-se como que se de um elenco se tratasse e há sempre uma perspectiva maniqueísta.

Há o mau da fita, o galã de serviço, o que é meio tosco mas que dá jeito para saber certas e determinadas situações, o durão, o ingénuo, aquele a quem são sempre atribuídas as culpas de qualquer incidente, o pouco inteligente, o sensível, o mal amado, o incompreendido.

Há os que têm dificuldade em se lembrar do argumento. São aqueles que se formam num clube, lhe juram amor eterno, que dizem gostar dele para todo o sempre porque é um clube que luta sempre para ser campeão e que, volvidos alguns anos, se mudam de armas e bagagens para outro país, e que apesar de terem assinado por um clube de meio da tabela voltam a proferir com todo o orgulho "Vim para um grande clube".

No Futebol tal como nas novelas tem que haver sempre alguém que sofra de um estado amnésico e se esqueça do passado para dar algum interesse à trama. São os futebolistas que quando saem de um clube e descansam os adeptos dizendo "Em Portugal só no clube X" e que algumas épocas depois experimentam A, B, C, Y, X e Z.

Depois há também os maus actores. Aqueles que lhe pisam o dedo mindinho do pé e rebolam e choram baba e ranho agarrados ao nariz.

Apraz-me perguntar perante tão maus desempenhos e exemplos porque lhes damos tanto tempo de antena.

Que outras classes com tão poucos dotes de eloquência têm direito a tanto tempo de emissão semanal?

Quantos jovens com projectos credíveis para a sociedade civil têm acesso a este espaço de visibilidade?

Porque damos cobertura de um minuto a um prémio nobel e quinze minutos a um futebolista que resume o seu discurso a meia dúzia de expressões que não são mais do que frases feitas ?


Rubricou hoje uma excelente exibição. Resposta: "O que importa é que a equipa ganhou e eu só estou aqui para ajudar a equipa"

A equipa hoje não esteve ao seu nível Resposta: "Há que olhar em frente, não atirar a toalha ao chão"


A este vácuo intelectual soma-se uma exuberância consumista absurda. Devem ser resquícios da competitividade que lhes és incutida mas até no domínio da "aperaltação" eles competem. Procuram o penteado mais irreverente, a roupa mais chamativa, os acessórios mais absurdos, os carros mais vistosos, esbanjam dinheiros em coisas que não são mais do que puro materialismo.

E são estes os ídolos da juventude..


segunda-feira, 21 de julho de 2008

TVI: Incendiários


Alguém na TVI saberá realmente o significado da expressão responsabilidade pública?

Tenho as minhas dúvidas.

Por volta do ano 2000 a TVI, ao leme de José Eduardo Moniz, enveredou numa estratégia de sensacionalismo que passava pelos programas "reality-show" como o era o Big Brother e por uma impregnação dessa postura no jornalismo. Resultado um jornalismo popular, tablóide, por vezes com conteúdos que em nada se adequam à prática da profissão e ao espaço onde são exibidos.

Contudo, nos últimos anos, o cenário tem-se vindo a alterar gradualmente. Não sei se por força da sedimentação das audiências, da posição estratégica ou por imposição da nova administração (os espanhóis do grupo PRISA) o jornalismo da estação de Queluz tem dado mostras de um incremento qualitativo, tendo mesmo grandes reportagens de grande qualidade. Não sei se também por mero acaso mas a informação da TVI tornou-se mais séria coincidentemente com o afastamento de Manuela Moura Guedes dos espaços noticiosos.

Novamente regressada aos ecrãs e por imperativos de fidelidade a um estilo só seu a "mulher-do-patrão" ressurgiu com o seu tão sobejamente conhecido estilo, não se imiscuindo de misturar informação com opinião pessoal.

Outros aspectos que me irritam são os conteúdos e as expressões usadas constantemente nos espaços informativos da TVI.

"Crise", "Bancarrota", "Apertar de Cinto", "Desespero", "Beco-sem-saída".

Será que alguém na TVI ainda não se apercebeu que todo o país já sentiu as consequências da conjuntura internacional, dos aumentos dos combustíveis, da especulação agrícola, do aumento das taxas de juros?

Será mesmo necessário que uma televisão que tem responsabilidade pública estar meia hora a falar num estilo melodramático a acentuar um desânimo que todos naturalmente sentimos? Não competiria a essa mesma estação abordar a crise e depois procurar mostrar aos cidadãos alternativas para a ela escapar?

Enquanto que um jornalismo positivo impele as pessoas num dinamismo e numa abertura de horizontes, o jornalismo negativo e obtuso da TVI só leva a uma sociedade mente capta de velhos do Restelo.


Afinal ninguém vai a um psicólogo para se sentir pior. Enquanto entidade de responsabilidade pública cabe a TVI, tanto denunciar a conjuntura negativa como mostrar alternativas. Mais do que informar compete-lhe formar.

Outro aspecto prende-se com um jornalista que já aqui elogiei aquando do caso Maddie: Hernâni Carvalho.

Este senhor desempenhou um trabalho ímpar na denuncia das teias de poder que se operavam nos meandros deste caso de contornos dúbios. Fez do seu espírito «incendiário», como o próprio diz, fez da sua força motriz e também do seu estilo acutilante um meio para conseguir ver para além do óbvio conseguindo dados importantes para a investigação.

Apesar de todos os créditos que lhe reconheço há coisas que não posso tolerar.

Qualquer pessoa que tenha o privilégio de aceder à televisão e ter um tempo de antena alargado deve, primeiro, perceber a responsabilidade que lhe está depositada, segundo, saber para quem está a falar.

O jornalista Hernâni Carvalho tem uma rubrica no programa matinal "Você na TV". Não é necessário ser-se um génio em sondagens e audiometria televisiva para sabermos que o público alvo dum programa matutino é essencialmente constituído por idosos, crianças e desempregados, logo uma população mais frágil quer física, quer psicologicamente.

O seu espaço, denominado de "Crime diz Ele" ressuscita a mítica série americana protagonizada por Angela Lansbury, o "Crime disse Ela" (Murder she Wrote). O problema é que Hernâni é recorrente em algo que só tem o condão de criar alarmismo público, essencialmente em falanges da população que são mais vulneráveis. Alguém explique a este senhor que por meia dúzia de bandalhos terem invadido uma esquadra da polícia nem todas as esquadras vão ser invadidas, que por um bebé desaparecer no hospital de Penafiel, nem todos os bebés vão desaparecer e não teremos que instalar chips e pulseiras a torto e direito para evitar essa hecatombe.

Generalizar é tão perigoso, repudiante mesmo.