quarta-feira, 16 de maio de 2007

Bento XVI: Homem Jesus


A visita que o Papa Bento XVI fez ao Brasil foi quase um símbolo dos desafios que a Igreja Católica terá de enfrentar neste virar de século.


Se por um lado o Brasil foi escolhido por ser um exemplo de tolerância religiosa, o real motivo da visita foi o de ser urgente revigorar o catolicismo num país que, desde há 20 anos, perde milhares de fiéis para cultos evangélicos. Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em 1991 os católicos representavam 83,8 por cento da população, em 2001, totalizam 73,9 por cento. Mas este fenómeno de debandada católica não é exclusivo do Brasil, um pouco por todo o Mundo a Igreja Católica vai perdendo, progressivamente, a sua influência.


A proliferação destes cultos alternativos tem vindo a merecer a atenção de Joseph Ratzinger desde os tempos em que era prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé. Segundo ele a fragmentação da Igreja Católica em "facções com diferentes correntes ideológicas" perpassa a ilusão de uma Igreja politico-partidária na qual se podem escolher facções, mais progressistas ou mais conservadoras.


Aquilo que a Igreja Católica se esquece é que, na base para tamanha adesão a estes cultos, estão frustrações causadas pela Igreja-mãe.


A um João Paulo II actuante, conciliador, promovedor do espírito ecuménico e, de certa forma, progressista, sucedeu-lhe um Papa teorizador, defensor da doutrina e profundamente conservador.


Bento XVI defende uma Igreja que retome as suas origens, práticas e tradições. O grande binómio que o Vaticano terá de enfrentar no século XXI será certamente o de decidir se aproxima a igreja de Deus ou então do Homem.


Neste aspecto Bento XVI é peremptório: a Igreja não precisa de consensos. Defende que "uma Igreja assente sobre as decisões de uma maioria torna-se uma Igreja puramente humana reduzida ao nível do que é factível e plausível. Assim a opinião substitui a fé.". O Papa critica também alguns teólogos por enviesarem o seu trabalho querendo ser criativos e em nada contribuírem para aprofundar e pregar valores seculares.


O pontificado de Bento XVI será, concerteza, um contrapeso àquilo que o Papa apelida de pensamento moderno. "Talvez os homens possam perceber que contra a ideologia da banalidade, que domina o Mundo, é necessária uma oposição, e que a Igreja pode ser moderna, sendo precisamente anti-moderna, opondo-se àquilo que todos dizem".


Segundo Benedictus PP. XVI o seu papel será o de conseguir um equilíbrio entre harmonia e concórdia, num mundo dominado por uma ditadura do relativismo em que nada parece definitivo e tudo deve ser feito à imagem do ego humano dependendo do contexto, conveniência e utilidade.


É sobretudo pelo seu carácter antidogmático, ou seja, de rejeição de verdades absolutas, que o pensamento moderno ameaça a doutrina eclesiástica.


Segundo o historiador Dag Tessore, Bento XVI afirma que "numa sociedade que, depois de Freud desconfia de todo o pai e de todo o paternalismo, obscurece-se a ideia do Pai Criador ao qual dirigir-se de joelhos". Urge à Igreja recuperar a imagem de um Deus metafísico mas Paternal.


No fundo, Bento XVI reclama que o pensamento moderno tem vindo a humanizar excessivamente a figura de Jesus, tornando a relação dos fiéis para com a Divindade numa relação entre iguais. De um lado o homem, do outro, o "homem Jesus".


Recentemente na sua primeira exortação apostólica, um documento com mais de cem páginas, essencialmente centrado na Eucaristia, Bento XVI reiterou a sua linha conservadora.


A liturgia será, cada vez mais, uma celebração sóbria e discreta de forma a combater a "teatralidade", a "banalidade" o "racionalismo infantil" que tem impregnado as cerimónias segundo o Papa.


Bento XVI exige que, exceptuando as homilias e leituras, regresse o latim e o canto gregoriano às missas. Bento XVI diz que "mesmo que os participantes possam não compreender toda e cada uma das palavras, captam o significado profundo, a presença do mistério, que transcende todas as palavras".


Os gestos excessivos deverão ser igualmente banidos de forma a manter um clima adequado à celebração.


O padre que celebrar a missa deverá fazê-lo de costas para os fiéis. Caso contrário "o sacerdote torna-se o verdadeiro ponto de referência de toda a celebração. Tudo termina nele". Bento XVI procurou dissecar o verdadeiro sentido desta afirmação "não se trata de um voltar as costas ao povo, mas de assumir a mesma orientação do povo."


A defesa exacerbada do celibato, a rejeição do preservativo e este rol de doutrinas ultraconversadoras colocam a Igreja Católica na rota de uma neo Idade Média, na medida em que Deus é o centro do culto e o fiel é apenas um mero súbdito. Se as criticas da Igreja Católica Apostólica Romana vão no sentido de todas as criações humanas à volta da liturgia terem chegado ao nível de um "circo de aldeia" então que se respeite integralmente a doutrina criada por Jesus Cristo. Que os líderes da Igreja se despojem e renunciem as bens materiais assim como Jesus o fez, que se pregue a doutrina ao ar livre.


Ao contrário do que a Igreja Católica tenta perpassar, segundo o Novo Testamento, Jesus Cristo sempre recusou o estatuto de divindade e sempre conviveu entre os demais humanos.


Uma vez mais a Igreja divergiu do homem.


Num próximo artigo serão analisadas algumas traves-mestras do pensamento de Bento XVI relativamente à Ciência, ao Aborto, à moral sexual, à familia, ao celibato, à homosexualidade, ao papel da mulher e aos novos desafios da Igreja.


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